terça-feira, 27 de dezembro de 2011

Mais Artur da Távola

Sobre a nossa reflexão a respeito do yama do mês, compartilho mais uma crônica perfeita do Artur, que traduz o que é essência para mim.

Tempo de Estar e tempo de Ser

Eu creio que você vai me entender: a gente nem sempre é a posição em que está. Falei claro? A gente foi a posição em que está. Ao assumi-la a gente já mudou. A posição em que a gente está, é condicionada por causas temporais e passageiras. Por justa, linda e generosa que seja, a posição em que se está é sempre muito menos do que a gente é. A gente é um composto que inclui, entre tantas outras coisas, a posição em que se está. Estar é parar. Ser é avançar.

Você crê numa coisa. Toma posição ao lado dela. Faz muito bem! Mas não englobe nem comprometa todo o seu ser, pois você é muito mais rico e complexo do que a posição na qual julga ter encontrado resposta para todos os seus problemas naquele instante.

Você é, inclusive, a negação da posição em que está. Ela e a negação dela compõem o que você é. Mas, a posição em que você está precisa negar tudo o que não esteja de acordo com ela. Principalmente o ser, pois o ser é sempre mais livre. Já, estar é mais cômodo. Porque estático. Estático é a condição do que está.

Quanto menos confiança na posição em que você está, mais acirrado em sua defesa você será. Quanto mais você perceba que é muito mais do que a posição em que está, mais ameaçado por ela ficará.
Se está complicado, perdão. Se está complexo, ainda bem! Cada vez que você deixar de ser para estar, você está abrindo mão de partes suas importantes e valorosas, trocando-as por coerências aparentes, por lógicas que a nada levam.
O estar é uma categoria do ser. É possível ser sem estar. Porque ser é abrangente, é total. Não é possível, porém, estar  sem ser. O máximo que é permitido ao estar é coincidir, por vezes, com o ser. O ser pertence ao cosmos. O estar pertence ao momento. O ser é necessário. O estar é contingente.
A posição em que você está é a expressão momentânea dos seus humores, das suas necessidades e das influências que você sofreu. Passará e mudará na medida em que elas mudarem. O que você É pertence a uma ordem diversa de valores, feita dos mistérios ou verdades de sua vida; das suas partes desconhecidas; das revelações; das partes sabidas; das suas relações com o amplo, o total, o uno, o completo.
No mundo das aparências ser é menos sedutor do que estar. Estar é viver cercado de acólitos, seguidores, justificadores, beneficiários, companheiros. Ser é solitário.
Eu venho do tempo dos que estão. Dos que desistiram de ser para estar. Todos com o melhor dos propósitos e as mais elevadas teorias de solidariedade humana, mas muitos <<estando>> e poucos <<sendo>>. O tempo de quem desistiu de ser para estar gerou guerras, destruições, deixando como herança, apenas e tão-somente, uma profunda vontade de Ser: porque a gente é sempre mais do que a posição em que se está.
Eu mudo sempre. Por isso sou ALGUÉM QUE JÁ NÃO FUI. Alguém que pretende estar apenas e até onde conseguir ser. Pouco. Mas todo.

Távola escreveu estas palavras na década de 70, mas elas continuam atuais como nunca. Que elas iluminem essa passagem de ano para todos, e que assim se possa distinguir melhor a essência da contingência - ambas fundamentais, mas uma perene e outra passageira. Para a contingência cabe aparigraha. Cabe o desprendimento para a mudança. Sempre.

2 comentários:

  1. Seu comentário está à altura da crônica, Julia! Feliz 2012, bjs.

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  2. Feliz 2012, Vita! Estou muito feliz, realmente, por estar podendo lê-lo. Thanks Beth e você!

    beijo grande

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